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comunidades na internet e a cozy web.

2023-09-03



quando eu penso sobre as comunidades formadas na internet, o esteriótipo são pessoas encerradas em grupos fechados em pequenas terras-sem-lei onde a defesa de um ponto de vista prevalece sobre quaisquer discussões que podem ser levantadas diplomaticamente.

é comum encontrar discussões que partem de algo completamente arbitrário e se tornam uma chuva de insultos de ambos os lados. iguais a tios no jantar de família falando sobre política. as pessoas se sentem empoderadas quando atuam sob o anonimato que se permitem ter na internet, mas nem sempre é discutido o fator coletivo dessa liberdade.

vamos pensar, por enquanto, em redes sociais centralizadas, gratuitas e de massa. o exemplo mais marcante sendo o twitter (que enquanto eu escrevia se tornou x, mas eu não ligo).

# as bolhas

no momento em que as pessoas se organizam em grupos nas redes sociais, surge um sentimento quase patriótico de proteção à identidade da comunidade, e isso pode ser visto facilmente no twitter: fandoms onde qualquer interpretação alternativa de algum personagem é ativamente reprimida ou grupos de tecnologia onde qualquer preocupação justa é entendida como descrença.

é nítido, então, que existe um instinto pra se formarem bolhas na internet. logo, forma-se uma hierarquia social: naturalmente os que têm mais conexões na bolha têm mais influência e qualquer desentendimento pode fragmentar a comunidade porque quem se destaca, os influenciadores, agora comandam um pequeno exército.

cada vez mais conflitos acontecem porque essas fragmentações criam relações de antagonismo entre uma subcomunidade e outra e elas, compartilhando interesses iniciais, tendem a ocupar os mesmos espaços nas redes e o crescimento delas apenas torna mais comum as fragmentações. imagine um galho que se ramifica da árvore e, quando cresce demais, pesa e cai como uma muda. essas duas árvores agora competem pelos nutrientes.

isso faz com que seja complicado formar relacionamentos fortes com as pessoas exclusivamente nas timelines das redes, porque elas são essencialmente as trincheiras da internet.

# qualidade do conteúdo

voltando ao esteriótipo de antes: no twitter, cada um pode interagir com quem quiser a qualquer momento e nenhum usuário é superior no que pode fazer (ignorando o twitter blue), mas o algoritmo promove publicações com um alto número de engajamento. por isso, é comum que as publicações e comentários mais controversos sejam encontrados no topo da lista, trazendo a impressão de caos.

em contato com esse tipo de algoritmo, onde o engajamento prevalece, o incentivo não está na qualidade das publicações, mas na capacidade de atrair uma grande massa de pessoas. assim, além de trolls descarados, alguns tipos específicos de conteúdo de baixo esforço começam a ser incentivados:

esse problema não pode ser solucionado por parte da moderação de uma plataforma centralizada, porque teria que se posicionar contra um certo tipo de conteúdo e consequentemente perder parte de seus usuários.

a responsabilidade de cuidar de seus espaços, garantindo a qualidade, cai nas mãos dos usuários, e os algoritmos apenas dificultam esse trabalho.

existem duas outras formas simples de organizar o conteúdo: um sistema de votos como no raddle ou no hacker news, onde o conteúdo recebe votos positivos ou negativos dos usuários e a diferença serve como parâmetro para ordená-lo, e a ordem cronológica inversa: o conteúdo mais recente fica no topo.

ambas as formas têm problemas de escala: na primeira, qualquer grupo pode dar downvotes em massa pra suprimir uma publicação; na segunda, a dificuldade em encontrar publicações de qualidade aumenta conforme o número de pessoas no feed.

# fechando os portões

o que acontece quando você quer se proteger desse das bolhas tóxicas e conteúdo nocivo? você se esconde. é o que propuseram yancey strickler e venkatesh rao.

imagine que você está na internet, com amigos que fez em uma rede social qualquer, e de repente a comunicação entre vocês começa a ser afetada por alguns dos males mais comuns das redes: propagandas, bots, brigas, fake news ou quaisquer outros assuntos indesejados. a maioria deles começam a surgir porque, mesmo que a plataforma se apresente como acolhedora, quando chegam problemas financeiros relacionados ao fluxo de usuários começam a surgir cortes em moderação e aumento de anúncios.

o caminho natural é que você procure uma plataforma fechada: crie um grupo de whatsapp, um servidor no discord, ou qualquer outro tipo de plataforma onde cada pessoa deve ser convidada por fora. essas redes são a cozy web. nas redes "aconchegantes", o problema das bolhas é interrompido pela raiz: o indivíduo que criou o grupo, se posicionando como administrador ou moderador, por possuir uma relação pessoal com cada um dos outros membros, consegue reprimir tanto as bolhas quanto o conteúdo sensacionalista.

aqui existe uma desigualdade de poder, porque a figura do admin tem a liberdade de expulsar, silenciar e banir qualquer outro membro. essa hierarquia, porém, se mostra positiva porque os membros podem, no apertar de um botão, criar outro grupo. logo, aquele que governa os demais deve mostrar-se disposto a proteger a comunidade, caso contrário ela apenas se formará nas mãos de qualquer outro membro.

há a formação de um ditador benevolente simplesmente porque todos possuem a liberdade de se reorganizar.

aí a dificuldade vira outra. como você vai conhecer pessoas novas na internet quando você seleciona a dedo todos os participantes da comunidade? nas outras redes sociais, ou todas as pessoas são distribuídas no mesmo espaço, ou dividem-se em pequenas comunidades — também públicas — para organizar os usuários de acordo com seus interesses (como no reddit). agora, no seu pequeno grupo, você não vai conhecer pessoas novas passivamente: os membros da comunidade terão que participar no povoamento, escolhendo com moderação quem será convidado ao grupo.

na minha opinião, esse êxodo define uma mudança de mentalidade na internet. porém, eu aposto nas redes sociais federadas como próximas candidatas.



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